sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O HOMEM

A porta da gaiola estava aberta, mas o pássaro não voava.
O homem ficou olhando sem entender. "Por quê o pássaro não voa?", pensou.
O pássaro ficava à porta, no limite entre a liberdade e a gaiola. Não voava.
Há algum tempo o homem havia encontrado o pássaro em um lugar distante dali. Estava de passagem por aqueles lados, quando viu o pássaro no canto. Quieto. Sozinho. Machucado? Não, não estava...
O homem foi chegando perto, devagar, curioso. O pássaro não voou.
Ele tinha algo estranho, diferente. Era diferente dos outros pássaros que cantavam alto, barulhentos, e fugiam ao menor sinal de aproximação. Esse não. Esse tinha alguma coisa. Não fugiu. Ficou lá... no canto.
O homem pegou o pássaro e o levou para casa. Comprou uma gaiola bonita. Achou que o pássaro precisava de uma gaiola bonita.
O homem, que vivia até então sozinho, passou a cuidar do pássaro.
Todos os dias.
Em sua solidão de homem, passou a amar o pássaro.
O pássaro retribuía o amor do homem, cantando.

O PÁSSARO

O pássaro sentia-se triste e sozinho, quando o homem apareceu.
Naquele momento ele tentava ver o mundo uma forma diferente. Não por cima das copas de árvores, protegido, mas do chão.
Via pessoas passando apressadas, sem olharem para ele. Algumas o viam e desviavam, talvez para não machucá-lo. Outras continuavam seu caminho não se importando com ele.
Ele foi para um canto, para não ser pisado, e lá ficou, olhando o mundo.

Quando o homem apareceu, ele não ofereceu resistência.
O homem tinha um olhar doce, e falava com ele. Ele não entendia o que o homem dizia, mas a voz... o tom de voz do homem era suave, como música...como um canto de pássaro, que ele entendia tão bem.

Em seu coração de pássaro, aprendeu a amar o homem que dia-a-dia cuidava dele com amor. Alegrava-se quando o homem chegava do trabalho. O homem dava atenção e carinho, como ele nunca teve antes, no mundo dos pássaros.
Mas, no restante do tempo, quando o homem não estava em casa, ele ficava triste, sozinho em sua gaiola.
Começou a sentir falta dos outros pássaros. De sua família. A família que ficou naquela árvore tão distante, quando o homem o pegou.
Mas ele amava o homem.

O HOMEM


O homem começou a observar que o pássaro andava triste. Já não cantava.
Achou até que o pássaro poderia estar doente. Mas não estava. Imaginou, então, que era a saudade... Saudade de pássaro.

O homem foi ficando triste também.
Seu coração de homem queria continuar com o pássaro que ele amava, mas o mesmo amor o fazia querer vê-lo livre, outra vez cantando. Então, naquele dia, o homem decidiu libertar o pássaro. Mas o pássaro não voava. Ficava apenas na porta da gaiola.

O PÁSSARO

O pássaro não entendia porquê o homem abrira a porta da gaiola. Não o queria mais? Não o amava, como ele amava o homem?
O pássaro olhava o homem e o mundo, agora sem grades.
A alma de pássaro queria voltar às árvores.
O coração de pássaro queria ficar com o homem.

Teria o homem cansado dele, porque ele não mais cantava?

A ESCOLHA

O coração do pássaro o fazia não voar.
O coração do homem o fazia esperar.
Nenhum dos dois parecia saber o que fazer.

Então o homem, com uma das mãos, fez o pássaro sair da gaiola. Suavemente. Em um ato de amor maior. Amor que liberta.

E assim, o pássaro voou, cantando um choro de saudade pelo homem.
E o homem chorou. O choro de
saudade por seu pássaro.

2 comentários:

Unknown disse...

Caramba. Lindo e cheio de significados.
Muito útil esse texto. Já tentei explicar essa situação, mas não tão bem assim.

Luz Noturna disse...

Gostei do comentário.....